Quem mora em Campinas, nascido ou vindo de fora, ou até aqueles que tem passagem constante pela cidade, quase sempre tem uma lembrança do Giovanetti. E os que não estiveram lá, pelo menos ouviram falar. Sem dúvida, é um lugar obrigatório para se conhecer, em especial a primeira unidade, no Largo do Rosário, que foi exatamente onde tudo começou em maio de 1937, pelas mãos do imigrante italiano Enrico Giovannetti.
Segundo o gerente Wagner Bordin, desde o início, o bar tinha a proposta de ser uma casa dedicada à valorização da boa gastronomia e da cultura. “Os salgados eram preparados pela esposa de Enrico, dona Helena Giovannetti, que todos os dias pegava o bonde para levar suas iguarias para o deleite dos frequentadores. O atual balcão de madeira do Gio Rosário e as peças de frios penduradas acima dele retratam muito bem o estilo do botequim dos anos 30. Nas décadas de 30 e 40, um dos atrativos da casa era a “Rádio Janela”. Cantores renomados e calouros apresentavam espetáculos musicais ao vivo no último andar do prédio, o que encantava os clientes do bar”, revela.
E foi nesse ritmo, que o Giovanetti completou neste mês 80 anos de existência. A marca, que hoje está em três pontos da cidade – mas já foram seis -, atravessou décadas proporcionando momentos de descontração e boas recordações a um número incontável de pessoas.
Em alguns casos, as unidades com características diferenciadas propiciaram que clientes pudessem aproveitar o bar em várias etapas de suas vidas, como aconteceu com a executiva de vendas Niara Grupe. Ela conta que quando ainda não tinha filhos, ia ao Giovanetti 4, onde jogava sinuca com os amigos. A maternidade, no entanto, fez com que começasse a frequentar a casa em outro endereço. “Passei a ir ao 5, que fica ao lado da prefeitura, porque era o único que tinha espaço kids na época em que minha filha era pequena”, lembra.
Os petiscos citados por Garcia são clássicos do cardápio do bar e sempre valem ser degustados mais uma vez. Junto dos sabores que conquistam e fazem os clientes voltarem, tem também história e um tanto bom de cultura gastronômica. “Os lanches Psicodélico e Casquinha foram criados nos anos 1960 por um antigo funcionário da empresa, o lancheiro Álvaro Manoel Braz, mais conhecido como “Moleza”. Ele recebeu o apelido por causa do seu jeito “desajeitado” de andar”, revela o gerente do Giovanetti, Wagner Bordin.
Mas, o mais interessante nesta história, é que o modo de Moleza cortar lanche em pequenos pedaços – para facilitar a mastigação principalmente das mulheres – tornou-se uma marca não apenas do Giovanetti, mas da comida de boteco da cidade. “O corte ganhou o nome de “boca-de-anjo” e hoje está presente na maioria dos bares de Campinas e até de outras cidades”, conta.
Assim como Moleza, outros funcionários são parte da história da casa e são marcantes para os clientes, tanto quanto os petiscos servidos por lá. O gerente Genilson Urcino é um deles, certamente. Ele faz parte, por exemplo, do relacionamento de longa-data da família de Erica Araium, professora de jornalismo gastronômico e idealizadora do projeto Diálogos Comestíveis, com o bar.
Em conversa com Entre Sabores, ela contou que, desde pequena, acompanhava seus pais nas tardes de sábado a uma das unidades – ora no do Largo do Rosário, ora no da Barão de Jaguara.
“Minha mãe sempre preferiu o chope escuro bem tirado (com colarinho). Meu pai, o claro, mas sem colarinho alto. Por conta do jeito dele de ‘serpentinar’, pedia sempre ‘um claro com um dedo de colarinho, não mais que isso. Um dedinho, por favor'”, lembra. E foi assim até o fim.
Mesmo depois de ficar doente (ele teve Esclerose Lateral Amiotrófica), Érica disse que o passeio do pai – já em cadeira de rodas – era ir à choperia. “Como tinha perdido o movimento das mãos e dos braços, ele tinha vergonha de comer na frente dos outros quando saía. Minha mãe ajudava e o Genilson também”.
Recentemente, a jornalista descobriu, por acaso, uma homenagem do Giovanetti a seu pai. “Esses dias publiquei uma foto da bolacha comemorativa dos 80 anos e minha mãe viu no Instagram. O Chopp Nogueira assinalado na bolacha ela reconheceu como sendo homenagem ao meu pai. Perguntei à assessoria de imprensa e era mesmo. Os garçons me contaram que muita gente pede o chope Nogueira!”, conta entusiasmada.
A homenagem fez, depois de 18 anos, Mirna Araium voltar ao Gio Rosário acompanhada da filha. “A gente encontrou o Genilson e foi muito bacana poder matar as saudades do amigo e beber uns nogueira pelo meu pai”, finaliza Érica.
Tradição e modernidade
Toda essa história com a cidade e as pessoas, bem como manter a tradição de seus petiscos, são importantes para o Giovanetti, segundo o gerente Wagner Bordin. Mas ele afirma que há também a preocupação de atualizar as unidades em diferentes aspectos, seja na modernização de processos e rotinas, ou na busca primorosa por fornecedores de insumos de alta qualidade.
Além disso, a ideia é sempre evoluir o cardápio. Por este motivo, aproveitando a ocasião do aniversário da marca, a administração decidiu investir em profissionais renomados que trouxessem novidades para as casas, a começar pelo Gio Rosário.
Foi assim que ainda em 2016, foi lançada a carta de drinks elaborada pelo renomado bartender Kascão Oliveira. Desde então, quem visita o local pode provar bebidas reconhecidas do público de bar, caso do negrone, outros mais refrescantes como o Aperol Spritz, até criações exclusivas como a caipirinha Giovannetti, preparada com cachaça comemorativa dos 80 anos da marca.
Já os novos pratos trazem as referências que influenciaram a casa desde a sua fundação, com assinatura do chef Diogo Silveira. Entre Sabores destaca dois das muitas novidades que devem ser provadas: a salada preparada com lula, camarão, cabeça de lula, polvo e peixe branco com folhas verdes e molho provençal e as almôndegas com polenta que vem com queijo e um molhinho nota 10.
“Eles introduziram novos itens com o propósito de valorizar a cultura de boteco e ao mesmo tempo render homenagem tanto ao fundador do Giovannetti quanto aos atuais proprietários, que têm ascendência portuguesa. Para a satisfação do grupo, as novidades agradaram em cheio aos clientes, que têm feito inúmeros elogios a pratos como o Bolovo, o Ossobuco de Vitela, o Cabrito ao Vinho, a Salada de Folhas com Frutos do Mar, entre outros”, comenta Bordin, que conclui: “o grande destaque do atual momento do Giovannetti é a conexão criada entre passado e presente e entre tradição e modernidade.”
Que venham mais 80 anos de Giovanetti!
No Replies to "Giovanetti: 80 anos de tradição, história e cultura gastronômica"