Ao contrário de muitas categorias cervejeiras que parecem ser grandes novidades, as cervejas selvagens são basicamente o “Big Bang” desse universo. Mas, ainda que elas estejam por aí há centenas e centenas de anos, não significa que não exista muito a descobrir sobre o assunto. Afinal, há tantos mistérios lá fora, não?
Não à toa, as cervejas selvagens foram assunto do 1º Encontro do Mundo da Cerveja Selvagem Brasileira, ciclo de debates que tentam definir o que é de fato tal cerveja, além de aventar temas como a problemática da união das selvagens com a gastronomia, as possibilidades do terroir brasileiro e os insumos locais. O evento foi realizado pela Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva) em 16 de junho, em São Paulo.
As cervejas selvagens nasceram junto com a descoberta da bebida. Quando eram fermentadas ao natural, ou seja, em tonéis ou recipientes abertos – e o conhecimento sobre os microorganismos responsáveis pelo processo mal existia. Por muito tempo acreditava-se que este era um trabalho dos deuses, e o tempo foi provando que, na realidade, era pura questão de biologia.
Por isso, as cervejas originais tinham características bem diferentes das que somos hoje acostumados. Os microorganismos selvagens presentes no ambiente que fermentam o líquido conferem aromas inusitados, pra dizer o mínimo. Se você leu o texto que falo sobre as Lambics, sabe do que estou dizendo. Se não, trocando em miúdos, as brettanomyces – leia aqui – são as responsáveis por gerar cervejas únicas, ácidas, secas e que chegam a lembrar aromas rústicos de suor e celeiro.
Mas, antes de torcer o nariz, é bom saber que é graças a essa levedura que o mundo conta com importantes estilos, além das Brett Beers.
O cenário selvagem por aqui é bem animador. Cervejarias como a mineira Zalaz, que produz seus rótulos em meio rural, são um caldeirão de ideias e receitas que englobam esse universo. Um bom exemplo é a Spontaneus #9 Fumaça, uma Farmhouse Ale defumada – ou Brett Saison – não pasteurizada, super viva, com 6,6% de teor alcoólico. A cerveja consegue reunir os aromas característicos da Brett (cultivada na propriedade da cervejaria, na Serra da Mantiqueira) em união com o toucinho do defumado, e quase nada de lúpulo.
Uma discussão bem interessante versa sobre a bela transformação que tal levedura opera nas uvas, que em vez de vinho, se tornam cerveja. Ainda que seja um nicho bastante novo, é promissor – e inclusive foi tema de um dos debates do Encontro da Abracerva. Afinal, é cerveja ou espumante? A Cosabella ousou em lançar uma linha exclusiva de cervejas selvagens com uva fermentada com brettanomyces: Chardonnay, Trebbiano, Cabernet Sauvignon e Rosé.
Quem gosta de boa bebida deve se livrar de amarras e rótulos ao degustar exemplares como estes. É o que ser selvagem significa. Saúde!
* Letícia Cruz Uma jornalista curiosa pelo mundo das cervejas compartilhando suas descobertas. Entusiasta da cerveja viva e local. Apaixonada pelos lúpulos! Criadora do @cervejopedia no Instagram e da loja @cervejopedia.beershop, que fica em Santana, capital paulista.
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