Baba au rhum: da história à receita

There is nothing to show here!
Slider with alias none not found.
 
 
Essa espécie de bolo embebido em rum, que mais parece um anel, anda sempre bem acompanhado por chantilly, frutas, geleia de damasco ou creme inglês. É saboroso, macio, perfumado e se distingue dos outros por derreter na boca.
 
“Um momento de perfeito prazer. Uma sobremesa que rende homenagem à grande tradição da confeitaria francesa e à sua história”, segundo Alain Ducasse, um dos mais bem sucedidos chefs franceses atuais – com 18 estrelas, no guia Michelin, conquistadas nos 27 restaurantes que tem espalhados pelo mundo. A receita, como tantas outras, nasceu por acaso. É invenção atribuída a Stanislas Leszczynski (1677-1766), um rei da Polônia que acabou deposto em 1709. Perdeu a coroa, mas ganhou do genro, Luis XV, dois milhões de francos e o grão-ducado de Lorena e Bar, na região da Alsácia-Lorena. Apreciador de teatro, música e literatura, Stanislas transformou Lunéville e Nancy em importantes centros culturais. Gostava também de caçar, cultivar plantas, colecionar porcelanas e escrever livros – como os quatro volumes de “Ouvres du bienfaisant philosophe” (1763). Mas gostava mesmo era da boa mesa. Por ordem sua, os confeiteiros do palácio lhe preparavam diariamente receitas típicas daquela região: büeraweka (pão de frutas), bettelmann (bolo de frutas secas), schnecke (pain aux rasins, no resto da França) ou, mais que todas, kugelhopf (broa com farinha de trigo, açúcar, amêndoas, groselha, manteiga, passas e sal).
 
Segundo uma lenda culinária, por considerar essa kugelhopf muito ressecada, teve a ideia de umedecê-la com vinho de Málaga; e tão bom foi o resultado, que nunca mais quis de outro jeito.Há duas versões para a origem do nome. Uma sugere decorrer da semelhança com o babka (nas línguas eslavas, “mulher idosa” ou “avó”), sobremesa típica da terra natal do rei deposto; sendo, esse tal de babka, bolo redondo (e fofo), de farinha de centeio, regado com um vinho doce da Hungria (o Tokaji) – tudo como, ainda hoje, é preparado, nas comunidades polonesas de todos os países. A outra versão aposta que seria homenagem a Ali Babá, herói favorito de Stanislas e personagem de “Ali Baba e os Quarenta Ladrões”, nas “Mil e Uma Noites” – coleção de contos populares árabes, indianos e persas, sem autor definido, traduzidos para o francês por Antoine Galland (em 1704).

Seja como for, aos poucos, a receita foi sendo aperfeiçoada. No palácio de Versalhes, pertencente à rainha Marie (filha de Stanislas), o bolo passou a ser regado com calda feita daquele mesmo vinho de Málaga – só que, agora, misturado com açúcar e açafrão. O restante da calda era posta em molheira, junto ao bolo, para que os comensais dela se servissem segundo seus gostos. “Na casa dos descendentes do bondoso rei o serviço das babas vem sempre acompanhado de uma molheira”, segundo Carême (1784-1833) – considerado “o rei dos cozinheiros e o cozinheiro dos reis”. Faltando só lembrar que essa rainha Marie, por conta de seus conhecidos excessos gastronômicos, chegou inclusive a receber extrema unção no dia em que praticou o doce pecado mortal da gula – ao degustar, de uma só vez, muitas dúzias de ostras. E tanto apreciava os bons pratos, dita rainha, que contratou para seus serviços o grande Vicent la Chapelle (1690-1745), antigo cozinheiro de muita gente famosa, inclusive Madame Pompadour – mesmo tendo sido essa madame amante de seu marido, o rei Luis XV. Mas essa é outra história.

Depois Nicolas Stohrer, confeiteiro de Lorena que trabalhou na cozinha do rei Stanislas, deu ao bolo sua receita definitiva: substituindo a massa pesada do kugelhopf, por outra mais leve e menos amanteigada; o vinho de Málaga, por rum; ainda acrescentando frutas e chantilly. A partir daí, recebeu o nome que até hoje tem – baba au rhun. Unindo o agradável ao útil, passou a vendê-lo (em 1730), na sua própria patisserie – rue Montorgueil 51, Paris. O lugar ainda existe com os painéis originais do pintor Paul Baudry (1828-1886), o mesmo que fez o foyer da Ópera de Paris, a Ópera Garnier – com nome em homenagem a Charles Garnier (1825-1898), arquiteto que a projetou.

Por seu sabor muito especial, foi a sobremesa escolhida por Babette (antiga chefe do Café Anglais, um dos mais importantes restaurantes de Paris – de1802 a1913), no banquete por ela preparado em “A Festa de Babette” – Oscar de melhor filme estrangeiro, em 1988. Pena que Hollywood só se preocupe com filmes; que, se o Oscar fosse dado também às sobremesas, esse Baba au Rhum seria candidato certo à estatueta.

Confira a receita!

Ingredientes

3 colheres de chá de açúcar
¼ de xícara de água quente
15 g de fermento seco
3 colheres de sopa de leite
60 g de manteiga
125 g de farinha de trigo
2 ovos
3 pitadas de sal

Para a calda

200 g de açúcar
1 ½ xícara de água
6 colheres de sopa de rum

Modo de Preparo

Em recipiente, coloque uma colher de chá de açúcar, água quente, fermento e deixe descansar, em lugar abafado, por 10 minutos.

Bata a manteiga até ficar cremosa. Aqueça o leite. Coloque a farinha em recipiente e faça um buraco no centro. Nesse buraco coloque ovos, sal, o restante do açúcar e a mistura de fermento. Mistura tudo. Junte a manteiga, mexa de novo e amasse tudo até obter uma massa lisa e elástica.
Coloque a massa em fôrma de buraco (24 cm), untada com manteiga. Tape com pano e deixe crescer até ao nível da borda da fôrma, por aproximadamente uma hora. Leve ao forno pré aquecido (200º C) por 25 minutos. Quando estiver assado, fure e junte a calda até que fique bem embebido. Leve à geladeira e sirva com creme chantilly.- Prepare a calda: leve ao fogo açúcar e água e deixe ferver. Retire do fogo e junte o rum.

Por Mokrane Kahlal

Consultor em Gastronomia, chef na Casa Fagundes em Caxias do Sul (RS) e Professor em Gastronomia Árabe e Mediterrânea na empresa UCS Oficial. Também tem um livro publicado “Cozinha brasileita e italiana”, em parceria com outros dois chefs.

 

 

 

 

No Replies to "Baba au rhum: da história à receita"

    Leave a reply

    Your email address will not be published.