Tradições gastronômicas de Páscoa, por Sandra Mian

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PASCOAPor Sandra Mian*
Se há um povo que leva a relação entre comida e religião realmente a sério esse povo é o povo judeu. Claro que os muçulmanos, católicos e outros também, mas os judeus têm muito mais regras alimentares relacionadas com a religião. Tudo isso está devidamente codificado na Torah, o livro sagrado deles.
Estamos na época do Pessah, a Páscoa Judia. Em inglês é “Passover”, a passagem. Esse ano é de 22 a 30 de abril, coincidindo com a nossa Páscoa. É bom lembrar que a religião católica tem como base a judaica. Jesus era judeu e seguia as práticas – ou leis – do seu povo.
Não vou entrar aqui em todos os detalhes da Páscoa Judaica, mas uma coisa é fundamental pra eles: NÃO PODE HAVER NENHUM TIPO DE FERMENTAÇÃO NEM FARINHA NAS MISTURAS. Isso porque rememoram a fuga do Egito quando tiveram que sair correndo e não deu tempo de fazer o pão levedado. Por este motivo nesse período, o “pão” deles é o “matzo”, um tipo de biscoito seco sem fermentação alguma.
Pra não correr o risco que as massas fermentem, até os bolos têm a farinha excluída nessa época. E daí os judeus criaram bolos e doces incríveis totalmente sem farinha! Ao invés da farinha usam nozes moídas ou farinha de matzo, que seria um tipo de farinha de rosca.
Neste contexto estão os bolos de laranja sem farinha: eles são da tradição Sephardi, os judeus que viviam e vivem no Norte da África e sul da Europa. Eles influenciaram muitíssimo a culinária de países como Espanha e Itália. E uma das coisas que não pode faltar na mesa dos judeus é fruta cítrica. Isso porque um dos frutos cítricos – o ETROG –  faz parte dos rituais judeus. Daí aonde havia uma comunidade judia havia frutas cítricas, eles levavam pra todo lugar aonde iam.
Há inclusive um texto muito legal chamado “INFLUENCE OF RELIGION ON THE SPREAD OF CITRUS” que mostra bem como os judeus levaram frutos cítricos através do mundo.
Daí esses judeus juntaram as duas coisas: os cítricos e os bolos sem farinha e criaram obras-primas da gastronomia!
Se nessa Semana Santa vocês fizerem um desses bolos vão estar reproduzindo o que essas mulheres seguidoras das tradições judaicas fizeram e fazem há séculos. Eu acho lindíssimo esses ritos e tradições, eu creio que elas criam um vínculo entre a gente e nossos antepassados.
Independente da sua religião, esses bolos são carregados de simbolismo. O PASSOVER assim como a PÁSCOA são momentos cheios de emoção e deveriam ser momentos de pensarmos muito na nossa vida, nos nossos comportamentos, na maneira como falamos com nossos irmãos, sejam eles de outra fé, de outra cor ou até mesmo de outra linha política.
E o que melhor pra paz entre campos opostos que oferecer algo doce e feito com carinho? Comida irmana, apara arestas, facilita a conversa. Pois só com muita conversa e não com gritos e xingamentos vamos chegar a um ponto comum.
Uma receita de Bolo de Laranja
A receita abaixo pertence ao livro The Book of Jewish Food, assinado por Claudia Roden, uma das maiores especialistas mundiais na comida do Oriente Médio. Essa receita dá um bolo bem grande. Eu divido as quantias em 2 às vezes. Mas é um bolo que se guarda bem, bem coberto e na geladeira. Confira
Bolo de Laranja com farinha de amêndoas
Ingredientes
– 8 ovos, claras e gemas separadas
– 1 xícara (200 g) de açúcar comum
– raspinhas bem finas de 2 laranjas AMARELAS
– 2 colheres (chá) de canela em pó (se vocês conseguirem a canela mexicana, que é a verdadeira, vai ficar ainda melhor)
– 1 xícara (100g) de amêndoas  super bem moídas (ou farinha de amêndoas) – aqui pode e deve  ser com a pele (não assuste que o peso é o mesmo que abaixo; lembre-se que aqui são as amêndoas moídas que têm mais volume)
– 1/2 xícara (100 g) de amêndoas sem pele e picadas fininho (mas não em pó, é pra dar textura ao bolo).
Calda de Laranja
2 1/2 xícaras de suco de laranja fresquinho (600 ml)
1 xícara (chá) de açúcar
Modo de preparo
Bata as gemas com o açúcar, as raspinhas de laranja, a canela e as amêndoas todas (a farinha de amêndoas e a picadinha). Bata as claras em neve e misture delicamente as claras à mistura anterior. Eu em geral faço assim: coloco umas colherada de clara e misturo bem sem me preocupar muito. Isso vai deixar a massa bem leve e o resto das claras pode ser misturada sem problemas sem desinflar a massa.
Nessa altura do campeonato vocês já devem ter uma forma preparada, ou bem forrada com papel de forno ou untada e enfarinhada. Claro que se for pra um judeu não vai ser farinha mas sim “matzo meal” . Eu gosto de usar uma forma redonda de fundo removível, mais ou menos de uns 25 cm de diâmetro. Forno a 180oC. Leva mais ou menos uma hora ou um pouco mais pra assar.
A calda é feita colocando o suco e o açúcar pra ferver. Só deixe ferver até o açúcar dissolver completamente.
Quando o bolo tiver esfriado desenforme e faça furinhos com um palito em todo o bolo. Use um prato pra bolo fundo para poder coletar toda a calda porque vai escorrer, é assim mesmo. Agora vá ponde a calda morna ou em temperatura ambiente- não quente! – sobre o bolo. Vai escorrer. Daí com uma colher você vai pegando a calda que escorre e pondo novamente sobre o bolo,
Melhor fazer de véspera. Eu gosto dele geladinho. O jeito mais bonito e gostoso de servir é com fatias finas de laranja em calda. Ou doce de laranja em calda, as cascas cortadas em tirinhas. Uma colherada de iogurte grego ou creme de leite levemente batido SEM AÇÚCAR também é genial.
* Sandra Mian é engenheira de alimentos, estudiosa dos aspectos antropológicos da alimentação e criadora do Grupo Comida pra Estar de Bem com a vida no Facebook, espaço onde fala de técnicas, receitas e curiosidades do universo gastronômico. O grupo é aberto! Participe!
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